24.3.11

A substância do amor

A substância do amor

Como funciona a oxitocina, responsável por estabelecer
e reforçar os vínculos afetivos entre mãe e filho – e entre amigos,
namorados, amantes...


Naiara Magalhães
Album /Akg-Images /Latinstock
Madonna dei Palafrenieri, de Caravaggio (1571-1610)
Produzida no cérebro, a oxitocina é fundamental para fazer
com que a mulher se empenhe nos cuidados maternos
básicos e na proteção de seu filho contra os perigos.
Um simples olhar dela para seu rebento faz com que
seu cérebro seja inundado pela "molécula do amor"

Na definição do escritor francês Victor Hugo (1802-1885), ele é "pão maravilhoso que um deus divide e multiplica". Para James Joyce (1882-1941), um dos maiores gênios da literatura moderna, "tudo é incerto neste mundo hediondo, exceto ele". Sob a ótica da "dama do suspense" Agatha Christie (1890-1976), "diferente de qualquer outra coisa no mundo (...), ele ousa todas as coisas e extermina sem remorso tudo o que ficar em seu caminho". Na frase do para-choque de caminhão, ele é simplesmente imortal. Não importa o momento histórico, tampouco o prestígio literário de quem o decanta, o amor de mãe é sempre celebrado como o mais sublime dos sentimentos. Mas o que explica afeto tão singular? Com certeza, não se trata de uma invenção dos homens para subjugar o sexo feminino, como defendeu, em 1980, a escritora francesa Elisabeth Badinter no livro Um Amor Conquistado: o Mito do Amor Materno. Para além de todos os fatores culturais que o refinaram, amor de mãe é uma questão bioquímica, movida a oxitocina. Produzida no cérebro, essa substância estava associada, até vinte anos atrás, a dois importantes processos fisiológicos envolvidos na maternidade – as contrações uterinas no momento do parto e a liberação de leite durante a amamentação.
Hoje, já se sabe que a oxitocina também atua no cérebro materno de modo a fortalecer os laços de carinho com o filho, os cuidados básicos e de proteção. Basta uma mulher olhar para seu rebento e o cérebro dela se inunda de oxitocina. Se houver contato físico entre os dois, os níveis da substância vão às alturas. Diz o neurocientista Renato Sabbatini, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp): "Trata-se de uma questão evolutiva. O bebê depende muito da mãe para sobreviver, e a oxitocina é fundamental para fazer com que a mulher se dedique aos cuidados maternos". Com os avanços nos estudos da neuroquímica e o progresso dos exames de imagem, capazes de flagrar o cérebro em pleno funcionamento, os últimos estudos sobre o tema têm revelado que a importância da oxitocina vai muito além do berçário. As relações de amizade e do amor romântico também são alimentadas por oxitocina. Em mulheres e homens, ela é a substância do amor em todas as suas formas.
Produzida no hipotálamo, a molécula da oxitocina ativa as áreas relacionadas à afetividade, ajudando a estabelecer e a fortalecer os vínculos de afeição. Ela está, ainda, associada à produção de dopamina, o neurotransmissor responsável pelo controle do sistema de recompensa. Quanto maior a produção de oxitocina, mais intensa será a síntese de dopamina. Ou seja, maior será a vontade de repetir determinada experiência. No caso do sexo, imediatamente depois do orgasmo, os níveis de oxitocina sobem, em média, 40% – o que favorece a conexão emocional entre os parceiros. Se ele vai ligar ou não no dia seguinte, já é outra história. Um estudo publicado na revista científica americana Evolutionary Psychology, em 2007, mostrou que 66% das mulheres e 59% dos homens não se sentiam atraídos por seus parceiros até beijá-los. E o que os tornou atraentes aos olhos dos outros foi a oxitocina liberada durante o beijo. Em momentos como esse, quando aumenta a produção da substância, as áreas cerebrais associadas a sensações negativas, como estranhamento e medo, tendem a ficar mais apagadas. Ficam aguçadas, por sua vez, aquelas ligadas a empatia, cordialidade, confiança e generosidade.
Um dos estudos mais instigantes sobre o assunto foi coordenado pelo economista Ernst Fehr, da Universidade de Zurique. Duzentos homens foram divididos em dois grupos. Ao primeiro foi dada oxitocina, sob a forma de spray nasal. Ao segundo, placebo. A todos eles, Fehr propôs o "jogo da confiança". Por uma hora e meia, foram orientados a dividir ou doar dinheiro a seus pares – homens que eles não conheciam, com os quais nunca haviam trocado um olhar ou uma palavra. O grupo da oxitocina foi de longe o mais magnânimo. No fim da experiência, quase metade deles havia transferido todo (veja bem, todo) o dinheiro para um total desconhecido. É o que Fehr chamou de "confiança máxima". Em outro experimento, também usando spray de oxitocina, o psiquiatra René Hurlemann, da Universidade de Bonn, na Alemanha, e o neurocientista Keith Kendrick, do Instituto Babraham, na Inglaterra, testaram a empatia masculina diante de imagens como a de uma criança chorando ou a de uma menina abraçando um gato. O grupo de homens que inalou oxitocina demonstrou mais emoção ante as cenas que os "durões" do grupo placebo.
A oxitocina está em pelo menos duas frentes de investigação farmacológica bastante interessantes. A mais avançada delas é a da flibanserina, uma medicação originalmente desenvolvida como antidepressivo que tem se mostrado eficaz para o aumento da libido feminina. O remédio atua em sete neurotransmissores ligados ao desejo sexual, entre eles a oxitocina. A previsão é que o medicamento, já carimbado como o "Viagra feminino", chegue ao mercado até o fim do ano. Outros estudos examinam o uso da substância em crianças portadoras de autismo, transtorno que compromete a afetividade e as relações, cujas alternativas terapêuticas atuais são bem limitadas. Se comprovadas na prática as hipóteses dos especialistas, poderia até se falar, nesse caso, em cura pelo amor – pela química do amor.
Erich Lessing /Álbum /Latinstock
O Beijo, de Gustav Klimt (1862-1918)
Durante o beijo, ocorre a liberação de oxitocina, o que facilita a conexão
emocional entre os parceiros. No caso do sexo, imediatamente depois
do orgasmo, os níveis da substância sobem, em média, 40%
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12.3.11

Gravidez Após Morte Perinatal

 
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11.3.11

A criação da mãe moderna


A criação da mãe moderna
 
Revistas femininas da década de 1920 foram usadas na difusão de um novo papel da maternidade
© Maternidade - Eliseu Visconti, 1906

Esqueça o instinto materno, as dicas de mães, tias e avós. Na década de 1920, ser mãe de classe média exigia principalmente estar atenta e bem-informada sobre as orientações de como cuidar do filho estampadas nas páginas das revistas femininas, a partir da defesa e difusão de um discurso maternalista.

Por meio de matérias e artigos e de pu­blicidade dirigidos a mulheres, profissionais médicos reconheciam a presença de um instinto maternal inerente à natureza feminina, mas o consideravam insuficiente para a criação saudável dos filhos. Os chamados médicos higienistas se tornaram, assim, crescentemente presentes, ancorados nos pressupostos da higiene – e sua concepção de saúde como responsabilidade individual e alvo de processo educativo próprio. Esses profissionais eram informados pelos conhecimentos da eugenia e embebidos na atmosfera nacionalista que enxergava a viabilidade brasileira através de suas crianças. Apresentavam-se, portanto, como autoridades na promoção e na manutenção da saúde das crianças.

Para isso dedicaram-se, tanto em consultórios e hospitais quanto nas páginas de revistas e de livros, a uma campanha sistemática em prol do exercício de uma maternidade de base científica, orientada pelos princípios médicos da puericultura (especialidade da pediatria voltada para o acompanhamento do crescimento e desenvolvimento das crianças). “Ao se apoiarem na supremacia da ciência e da razão sobre a emoção – e nesse plano ganhando sua legitimidade –, os médicos ofereciam um amplo e diversificado estoque de ensinamentos técnicos para guiar a conduta das mulheres na criação de seus filhos, em substituição aos ‘antigos’ dogmas religiosos ou palpites de curiosas, vizinhas ou avós, considerados perniciosos e ‘arcaicos’. Usar e fazer ciência: este seria o novo papel social da mãe moderna”, explica a médica Maria Martha de Luna Freire, formada pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), doutora em história das ciências e da saúde pela Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz e professora do Instituto de Saúde da Comunidade da Universidade Federal Fluminense (UFF).

Maria Martha é autora da tese Mulheres, mães e médicos: discurso maternalista em revistas femininas (Rio de Janeiro e São Paulo, década de 1920), que acaba de sair em livro com o título Mulheres, mães e médicos – Discurso maternalista no Brasil (264 páginas, R$ 35), pela Editora FGV. Em seu estudo, ela se debruçou sobre duas publicações importantes da década de 1920: Vida Doméstica (1920-1963) e Revista Feminina (1914-1936). Os artigos assinados por médicos, explica, habitualmente recebiam títulos que reforçavam essa identidade, como “Palestra médica”, “Conselho médico”, “Puericultura”, “Medicina doméstica” ou “Medicina do lar”, e versavam sobre todo o amplo universo infantil: da roupa ao sono, da dentição à alimentação. “Práticas corriqueiras como o banho ou as brincadeiras infantis adquiriam a dimensão de rituais higiênicos, ocupando muitas páginas das revistas com explicações pormenorizadas dos procedimentos”, diz. Nesse contexto, novos “objetos de saúde” eram apresentados e seu uso estimulado como prerrogativa da mãe moderna, como o termômetro doméstico e a balança.
© Reprodução do livro Caricaturistas Brasileiros, Pedro Corrêa do Lago
O psiquismo da criança, desse modo, “passou a merecer cuidados especiais, por exemplo, com sugestões de estratégias para controlar o medo e a teimosia e o estímulo a leituras ‘sadias’”. Já os costumes associados à herança colonial, como o de embalar as crianças, eram fortemente condenados com base nos preceitos científicos. Segundo a pesquisadora, a alimentação infantil foi o campo mais explorado pelas matérias das revistas consultadas, principalmente no que se referia à defesa da amamentação – lado a lado com a prescrição de substitutos ao leite materno. “Ao transformar a alimentação em nutrição, e a cozinha em laboratório, essas matérias alçavam as mulheres ao status de ‘nutricionistas da família’, valorizando, de um lado, a função maternal, e, de outro, facilitando o acesso à profissionalização feminina no campo da nutrição.”
Mãe de quatro filhos, Maria Martha conta que vivenciou as dores e alegrias de gestar, parir e cuidar de crianças. Como médica, dedicou muitos anos de sua atividade profissional à puericultura. “Transitei, portanto, na dupla dimensão de agente e receptora das práticas de puericultura.” Nesse meio tempo, ela acumulou reflexões e questionamentos quanto às origens, aspectos ideológicos e limites da puericultura como campo de prática médica. A pesquisa para o doutorado a levou a concluir que a maternidade científica constituiu uma das dimensões do discurso maternalista, ao articular tanto os princípios científicos da puericultura − como principal ferramenta de ação médica − quanto os argumentos produzidos pelos movimentos feministas. “O discurso da maternidade científica, apesar de enunciado pelos médicos, não se reduziu, portanto, à autoridade destes, mas emergiu da confluência de seus interesses comuns com as mulheres − coprotagonistas da ação.”

No momento histórico em que a construção da nacionalidade adquiria papel central e a função maternal consolidava-se como preocupação de ordem pública, prossegue Maria Martha, a valorização da maternidade − ganhando novo significado como a valorização da própria nação brasileira − adquiriu maior força argumentativa e forneceu renovada justificativa tanto para o discurso médico quanto para o feminista. “Ao tornar as mulheres − na qualidade de mães − responsáveis pela formação dos futuros cidadãos brasileiros, tal concepção de maternidade lhe agregaria o status de função social, elevando também o prestígio dos médicos dedicados à higiene infantil. Assim, se esses profissionais enxergaram na valorização da maternidade um caminho para obterem reconhecimento e legitimação profissional, para as mulheres tal perspectiva representava uma maneira de extrapolar o espaço doméstico e melhorar sua posição social.”
© Reprodução do livro Caricaturistas Brasileiros, Pedro Corrêa do Lago
Articulistas - A qualificação das revistas femininas como espaço social de construção da aliança negociada entre mulheres e médicos se mostrou acertada na opinião da pesquisadora. “Concluí que a partir da dimensão compartilhada de modernidade as revistas conformaram o ambiente de circulação cultural adequado para a difusão do ideário da maternidade científica.” O crescente quantitativo de matérias que versavam sobre a maneira científica de cuidar das crianças e a fidelidade das assinantes confirmavam o interesse das leitoras no assunto. “As manifestações na seção de correspondência da Revista Feminina enalteciam a qualidade do periódico, noticiavam eventos feministas ou acontecimentos sociais e solicitavam orientação sobre questões de ordem variada − de moda a receitas culinárias.” Já a coluna do Dr. Wittrock, em Vida Doméstica, recebia perguntas mais específicas sobre os cuidados com as crianças, o que a transformava em verdadeiro “consultório médico”.
Da mesma maneira, a progressiva substituição dos anúncios publicitários relativos ao campo dos insumos agrícolas e da zootecnia por reclames do campo da alimentação infantil − particularmente mais explícito em Vida Doméstica − representou outro sinal da penetração do discurso médico maternalista. “A análise do perfil dos articulistas forneceu outro indicativo da ade­quação das revistas femininas. Entre os colaboradores de Vida Doméstica e Revista Feminina, encontrei representantes da elite intelectual e médica da época, como Aprygio Gonzaga, Osorio Lopes, Antonio Wittrock, J. P. Fontenelle e Octavio Gonzaga.” Muitos desses autores ocupavam cargos de direção ou funções prestigiadas em instituições públicas, como o doutor Fontenelle − inspetor sanitário do Departamento de Saúde Pública e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Higiene −, o que confirmava ainda a capilaridade do movimento sanitarista brasileiro, como estratégia essencial do projeto reformista.

Da mesma forma, Maria Martha localizou entre os articulistas várias escritoras renomadas, como Ana de Castro Osorio, Chrysanthème, Condessa de Pardo Bazan e Maria de Eça − militantes de movimentos feministas e colaboradoras de periódicos em vários países −, o que reforçou o pressuposto da associação entre os ideários higienista, maternalista e feminista. “A presença simultânea de assinaturas tão distintas demonstra que o discurso maternalista expresso nas revistas femininas não se originava exclusivamente da comunidade médica, mas espelhava a convergência de interesses por parte de médicos e mulheres na construção do novo papel feminino de mãe.
Os dois primeiros anos da pesquisa de Maria Martha foram dedicados à reflexão teórica. A análise das fontes durou cerca de um ano, seguida de mais um ano para a redação final da tese. “Inicialmente localizei todas as revistas femininas que circularam na década de 1920, e, após uma análise preliminar, selecionei Vida Doméstica e Revista Feminina como representativas desse gênero de periódico, o qual prevê um conjunto de atributos, no que se refere à forma e ao conteúdo, habitualmente associados ao universo feminino – basicamente a moda e a literatura.” Ela observa que o longo período de circulação – 43 anos, a primeira; e 22 anos, a segunda – atestava a sua boa recepção e autorizava que fossem tomadas por exemplares do gênero. Foram examinados todos os exemplares das revistas produzidos na década de 1920, num total de 243 números.

Urbano - Através dos artigos publicados nas revistas, foi possível para a médica-pesquisadora perceber que as mulheres das camadas alta e média dos principais centros urbanos participaram ativamente da construção e difusão da ideologia da maternidade científica. “Ao reafirmarem a vinculação da função maternal à sua natureza e a compatibilidade de tal atribuição com outros papéis femininos, muitas dessas mulheres, em particular aquelas vinculadas aos movimentos feministas, aproveitaram a concepção de maternidade – como dimensão exclusiva do gênero – para aumentar seu poder e facilitar a reivindicação de outros direitos.” Endossaram, portanto, a ideologia da maternidade científica, enxergando na aliança com os médicos − e adesão aos princípios científicos da puericultura − meios para transformar a maternidade no papel social feminino.

Para essas mulheres, conclui Maria Martha, o exercício da maternidade científica, ao representar acesso ao espaço socialmente reconhecido da ciência − até então de domínio quase exclusivamente masculino −, constituiu caminho potencial de inserção dessas no espaço público − via filantropia ou trabalho profissional. 

Fapesp
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10.3.11

A (DES)CONSTRUÇÃO DA MATERNIDADE

A (DES)CONSTRUÇÃO DA MATERNIDADE

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PINTO, Maria das Graças C. da S. M. G. – Uniplac/Unifra – profgra@terra.com.br
GT:Gênero, Sexualidade e Educação / n. 23


Introdução

A maternidade tem se constituído cada vez mais em uma prática social que precisa ser repensada. Afinal, muito além de uma possibilidade biológica da mulher, a maternidade está permeada por valores que são pertinentes aos momentos e necessidades de um dado
período histórico. Considero, em um âmbito mais amplo das relações sociais, que a maternidade não se constitui apenas em uma prática restrita a mulher - que é mãe – mas envolve também o grupo nos quais suas relações sociais estão sendo estabelecidas.
Neste sentido, a maternidade deverá ser pensada também por meio das construções sociais de gênero, já que é pela relação entre os sexos que damos significado aos fatos sociais. Sem dúvida, ao falar em maternidade, existe um recorte implícito que, de certa forma, demonstra uma visão filtrada pelos olhares dos sujeitos de uma classe social, uma etnia e um sexo, que convivem em uma cultura específica.
A proposta desse trabalho é fruto de uma pesquisa de campo, que objetivava compreender as representações que homens e mulheres tinham acerca da maternidade.
Assim, após ouvir cinco pessoas1, três mulheres e dois homens por meio de entrevista semiestruturada  e pela metodologia de História de Vida, foi possível perceber a dimensão cultural influenciando as concepções, desejos e culpas em relação à maternidade. Alguns critérios foram respeitados para a escolha dos sujeitos, tais como: que estes tivessem filho(s), que vivessem ou tivessem vivido em situação conjugal, mesmo que por algum tempo, com a mãe ou pai biológica(o) deste(s) filho(s), que não houvesse grau de parentesco entre os sujeitos.

1 Nomes fictícios dos sujeitos: Márcia, trinta e oito anos, casada, tem uma filha, com treze anos e um filho com oito anos. Guta, trinta e quatro anos, casada, tem um filho com oito anos e uma filha com três anos. Cristina, quarenta e cinco anos, casada com Cristiano, professor, quarenta e nove anos. Tem três filhas uma com dezessete anos, outra com quatorze anos e uma com doze anos. - Carlos, quarenta e três anos, teve um relacionamento com Carmem, com quem teve uma filha, com quinze anos. Casou-se com Adriana, com quem teve um filho, com nove anos. Joel, trinta e quatro anos, casado, tem uma filha, com dois anos. (Idades correspondentes ao momento da coleta de dados).

A proposta de ouvir homens é porque entendo existir uma interdependência entre estes olhares específicos, o que acaba por justificar o viver socialmente. Em outras palavras, não se vive socialmente sem que haja uma isenção de sentidos entre o individual e o coletivo, tampouco entre os sexos, classe social, etnia, enfim, pelas características que marcam determinada cultura.

A maternidade nas fronteiras de Gênero

O processo de construção subjetiva da maternidade se dá também pelo que homens vivenciam e até imaginam ser a maternidade. Mulheres e homens têm formas distintas de significar uma mesma prática e indubitavelmente o sexo, seja biológico ou social, assume um marco diferencial nessa subjetivação. Nesse sentido, a perspectiva de gênero2 serve como importante aporte epistemológico para compreender a dinâmica relacional destas práticas sociais. Como diz Scott “o gênero é então um meio de decodificar o sentido e de compreender as relações complexas entre as diversas formas de interação humana” (1990, p.16).
A proposta central de gênero está, então, no reconhecimento da existência de uma relação entre a construção social de mulheres e homens, demarcando, dessa forma, a distinção entre a ordem biológica e social, no que diz respeito a como são construídas as diferenças entre os sexos. Gênero segundo Joan Scott, constitui-se em uma categoria de análise onde o núcleo essencial de definição repousa sobre a relação fundamental entre duas proposições. O gênero é um elemento constitutivo de relações sociais fundadas sobre as diferenças percebidas entre os sexos, e o gênero é um primeiro modo de dar significado às relações de poder (1990, p.14).

Opção pela maternidade: o que dizem as mulheres

2 A terminologia gênero pressupõe um percurso histórico relacionado à evolução do movimento feminista, bem como a própria enunciação das mulheres como sujeitos que construíram, e constroem a história. Para aprofundar o tema ver: Flax, (1991); Kofes (1993); Louro (1995).
Opção resulta em possibilidade de escolha. No que diz respeito à maternidade, nem sempre essa relação tem se mostrado tão fácil de ser percebida. Grande parte das vezes parece predominar um caráter de obrigatoriedade nessa “opção”.
Uma das primeiras indagações feitas aos sujeitos da pesquisa, dizia respeito a como ocorreu à opção pela maternidade. Segundo Cristina, essa decisão foi muito discutida, juntamente com seu marido, tendo surgido muitos momentos de “recuo”. Para Ela a “opção” por ter filhos a acompanhou desde muito cedo, inclusive com certo caráter de idealização. No caso de Márcia, esta relatou que ser mãe era um desejo desde a adolescência.
A opção pela maternidade demonstra estar menos relacionada com uma escolha do que propriamente com um fascínio, uma decorrência óbvia e natural da existência feminina.
Parece que outra possibilidade, como não ser mãe, não está tão fortemente inscrita, seja na infância, na adolescência ou na vida adulta. Dificilmente ouviremos alguém dizer: sempre quis não ser mãe.
Provavelmente um dos motivos para não se reconhecer o fato de que a maternidade deveria se configurar efetivamente em uma opção, esteja no peso social que recai sobre as mulheres que dizem não a essa prática. A observação de Jeanne Safer mostra isso: Muitas das mães que conheço as quais trabalham em tempo integral aplaudiram as mulheres que aparecem neste livro, e não lhes foi difícil demonstrar empatia com seu ponto de vista, ainda que elas mesmas tenham feito uma escolha diferente. Algumas chegaram até a confidenciar que não estavam seguras de que teriam tido filhos se soubessem quais eram as implicações. Entretanto, muitas das mulheres sem filhos com quem conversei depararam com perturbadores fluxos subterrâneos de sentimentos negativos e preconceitos inesperados contra elas. Estranhos contestavam sua feminilidade, sugerindo que eram frias e insensíveis, e a própria família questionava sua moralidade e maturidade (1997, p.156).

Reconhecer que ter filhos pode não ser o suficiente para a realização de uma mulher é proporcional a reconhecer os limites de uma série de “garantias de felicidade” introjetadas por nossa subjetividade em relação ao binômio mulher-mãe. Poderia questionar de onde vêm essas concepções, da natureza da mulher? Ou de uma vontade dominante produzida autoritariamente nos sujeitos? Ratifico o posicionamento de Elisabeth Badinter ao dizer: [...] Os valores de uma sociedade são por vezes tão imperiosos que têm um peso incalculável sobre os nossos desejos [...] A voz do ventre? Mas só hoje começamos a perceber como o desejo de ter um filho é complexo difícil de precisar e de isolar de toda uma rede de fatores psicológicos e sociais (1985, p.16).

Provavelmente esse tipo de análise não perpassa as discussões e planejamento, quando existe, da decisão de ter ou não filhos, muito menos da decisão de ser ou não mãe ou pai.

Opção pelos filhos: o que dizem os homens

Como analisar a opção pela maternidade, ouvindo homens, sem cair na paternidade? Ao longo das entrevistas, ficou claro que havia uma correspondência entre as representações de maternidade com a própria paternidade. Além disso, havia uma interdependência entre os sentidos atribuídos à maternidade e à paternidade, o que se justifica por estarem falando sobre uma experiência que está reconhecidamente localizada na outra pessoa. Assim, para os homens, a questão colocada foi sobre a opção pelos filhos.
Com relação à decisão de ter filhos, os homens demonstraram ter uma relação de dependência com a decisão de a mulher querer ter filhos ou não. Assim, quando falamos na opção pela maternidade em relação às mulheres, apesar de todas as limitações e entraves legítimos, possíveis a estas pela especificidade de gerar e parir, bem como apesar de toda pressão social existente para que exerçam a maternidade, ainda assim, pressupõe-se uma diferenciação com relação ao poder de decisão dos homens. Mulheres podem decidir ter filhos apesar da vontade dos homens de tê-los, enquanto que a recíproca não é verdadeira.
Nesse sentido, a maternidade pode prescindir da paternidade, mas a paternidade não pode prescindir da maternidade.

Considerações Finais
Quando decidi ouvir homens falando acerca de um assunto tão caracteristicamente marcado como “coisa de mulher”, não pensei poder somar tanto ao meu mundo feminino. A maternidade não era mais a soma de concepções de mulheres e homens,  mas a interação dessas. Meu referencial de homens e mulheres sofreu mais uma vez transformações significativas. Compreendi que a maternidade se configura muito mais em “maternidades” do que em uma forma única de vivenciar uma prática social que tem a cara do seu tempo histórico.
Não existe uma concepção universal sobre o que venha a ser maternidade. Implicações políticas, culturais, econômicas contribuem no sentido de produzir sentimentos de amor, de ódio, de culpa, de alegria, de tristeza, que servem em grande parte para nos inscrever em um padrão de normatização responsável por identificar e classificar os comportamentos, “esquadrinhando os corpos” e conformando os sujeitos ao que está instituído como sendo o natural, o certo, o invariável.
Interessante notar que, a educação esteve expressa nas condições estruturais nas quais são representadas as experiências com relação à maternidade. Destaco a concepção naturalizada que perpassou a opção pela maternidade, bem como a compreensão predominante de ser responsabilidade das mulheres o cuidado com os filhos ou filhas, retratando um modelo estereotipado de ser mãe; a importância da forma como o tempo se caracterizou para as mulheres - assumindo peculiaridades sexistas- ainda não totalmentesuperadas pelas mesmas; a decorrência das duplas jornadas de trabalho, no empreendimento profissional das mulheres. As evidências da dimensão educativa podem ser observadas ainda quando, Cristina diz sempre ter idealizado ter filhos; na projeção da maternidade de Márcia quando, desde a sua adolescência, achava que podia ser uma pessoa sozinha “sozinha eu digo, sem marido, não sem filho”; na concepção de Joel acerca a maternidade ser uma experiência mágica “que em geral, toda mulher quer ter”; na perspectiva de filho que Carlos expressou; na maternidade como coisa de menina à que Guta se referiu.
Os olhares que construíram as várias possibilidades de “maternidades” expressas neste trabalho transitaram entre o singular e o coletivo. Houve momentos em que as falas pareciam sintetizar o cruzamento de valores de tantas pessoas; outros, em que a experiência relatada parecia ser singular. Assim, transitei entre Márcia, Cristina, Joel, Carlos e Guta,  entre todas as pessoas que significaram suas vidas.
De alguma forma, a internalização de valores como resultado da maneira como fomos socializadas, educadas, persiste em nós, conduzindo “nossos desejos”. Mas se os vários cruzamentos fizeram da maternidade o que ela está sendo hoje, serão também os vários cruzamentos que irão possibilitar a sua desconstrução. Cruzamentos de olhares que entendam as maternidades para além do bem ou do mal.


Referências Bibliográficas

BADINTER, E. Um amor conquistado: o mito do amor materno. 8. ed. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 1985.
FLAX, J. Pós Modernismo e as relações de gênero na teoria feminista. In. Pós Modernismo e Política. Rio de Janeiro, Rocco, 1991.
KOFES, S. Categorias analítica empírica: gênero e mulher; disjunções conjunções e
mediações. Cadernos Pagu, vol. 1, 1993.
LOURO, G. L. Gênero, História e Educação: Construção e Desconstrução. Educação e Realidade Vol. 20, nº 2, 1995.
SAFER, J. Além da maternidade: Optando Por Uma Vida Sem Filhos. São Paulo:
Mandarim, 1997.
SCOTT, J. Gênero: Uma categoria útil de análises históricas. Educação e Realidade.
Porto Alegre: n. 16. 1990.
 
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9.3.11

Ser mãe na Colônia: a condição da mulher sob o aspecto da maternidade irregular

Ser mãe na Colônia: a condição da mulher sob o aspecto da maternidade irregular (séc. XVII e XVIII)
Renata Pedroso Araujo
Terceiro Ano - História/USP
download mulheres.rtf - 20KB
I- O panorama da Mulher na condição de esposa e mãe.
 
 
Pensar o papel da mulher no período colonial, sua sensibilidade e vivência, remete-nos a uma visão intrinsecamente vinculada ao aspecto familiar e doméstico. Assim, pensar a história da maternidade na colônia significa examinar a condição feminina no que se refere as suas funções nas relações familiares e conjugais, mas também perguntar de que maneira tais maternidades eram vivenciadas: de forma lícita e sacramentada, seguindo as orientações da Igreja e do Estado, como fruto da união matrimonial ou de formas consideradas ilícitas (fruto da sedução, do estupro ou de cópulas pré-conjugais, seguidas do abandono do noivo, por exemplo).
A Igreja, instituição mentora no projeto da difusão da importância do matrimônio, foi que, a serviço do Estado, impôs as normas de conduta que estabeleciam a divisão de incumbências no casamento, dentro do sistema patriarcal desenvolvido na colônia portuguesa na América. 

As janelas com gelosias são um marco
do controle e da eclusão feminina na
elite colonial
Dessa forma, sob a organização do Antigo Sistema Colonial, a vida feminina estava restrita "ao bom desempenho do governo doméstico e na assistência moral à família, fortalecendo seus laços"(SAMARA, 1983. P.59). O homem, por sua vez, tinha seu papel centrado na provisão da mulher e dos filhos, concentrando o poder de decisão na família. Os encargos do matrimônio, no que se refere à manutenção do casal e proteção dos bens, cabiam, portanto ao homem. A essa proteção cabia à mulher responder com obediência.
Existiam no entanto enormes discrepâncias no que diz respeito à realidade feminina quando se comparam diferentes classes sociais no Brasil, tanto no que diz respeito às funções domésticas e administrativas, quanto à maternidade. Diferentemente das mulheres de elite, na maioria das vezes correspondentes ao estereótipo de mulher submissa e mãe dedicada( seguindo as normas de conduta difundidas pela Igreja e pela legalização do Estado), descrito anteriormente, as mulheres mais pobres, pertencentes às camadas populares, por outro lado, não correspondiam em sua grande maioria, ao tipo de família que estudos e pesquisas encontram como tipologia. "A realidade colonial era a de lares pequenos e famílias com estruturas simplificadas"(DEL PRIORE, 1989. P. 46), sendo muito comum a existência de mães solteiras, que foram vítimas de exploração sexual e doméstica, traduzindo-se em humilhações, abandono e violência por parte do homem progenitor da criança. Assim, caracterizadas "como auto-sacrificadas, submissas sexualmente e materialmente reclusas, a imagem da mulher de elite se opõe à promiscuidade e à lascívia da mulher de classe subalterna, em regra mulata ou índia"(DEL PRIORE,1993. P. 46).
 
II- Maridos ausentes, mães solteiras e relações concubinárias.
 
Contrariando as normas estabelecidas pela Igreja, defensora primeira do matrimônio, grande parte das mulheres pobres estava inserida num cenário familiar caracterizado pela ausência dos maridos, companheiros instáveis, mulheres chefiando seus lares e crianças circulando em outras casas e sendo criadas por comadres, vizinhas e familiares. Muitas mulheres viviam também do relacionamento concubinário. A Igreja, por sua vez, apresentando o matrimônio como sinônimo de segurança e proteção, não cessava de tentar aproximar da sua pregação as mulheres que viviam fora dos padrões sociais estabelecidos. "Ao transferir para a Colônia uma legislação civil e religiosa que só reconhecia o estatuto social da mulher casada e mãe, a Igreja apertava o cerco em torno das formas não sacramentadas de convívio"(DEL PRIORE, 1993. P. 50).
Entre as classes subalternas, as formas não sacramentadas de convívio conjugal não eram absolutamente um empecilho para que as mulheres continuassem tendo filhos e tentassem criá-los. 

Representante da elite agrária, esta mulher optou
por utlizar suas melhores jóias no momento do retrato
Cabe então nesse momento, fazer a seguinte pergunta: até onde vai a passividade e a submissão feminina? As imagens da realidade, como se vê, são contraditórias e os estereótipos irreais.
Na verdade, a mobilidade geográfica dos maridos ou companheiros nos tempos de povoamento e instalação do sistema colonial( Séculos XVI, XVII e início do XVIII), deu ao concubinato uma enorme semelhança com o casamento, já que, na maior parte deles, os homens se encontravam distantes da família(pode-se apontar como principais fatores para a ausência dos homens as entradas no sertão e as viagens para as minas). Essas ausências acabaram por acarretar conseqüências: as mulheres passaram a se ver como chefes de suas casas e de suas famílias, já que foram obrigadas a lutar sozinhas por sua sobrevivência e pela sobrevivência dos filhos.
As ausências dos maridos transformavam-se muitas vezes em abandono do lar. Essas colocações sugerem novas imagens da mulher na família e na sociedade, com uma participação mais ativa , embora seu papel fosse limitado, frente à manutenção dos privilégios masculinos na estrutura social.
 
A luta pela sobrevivência familiar determinou uma maior ligação entre mães e filhos no que diz respeito ao trabalho, com a divisão das tarefas cotidianas necessárias para a obtenção dos víveres. Uma ocorrência comum, em meio as relações concubinárias, era a incorporação pela família de filhos ilegítimos, que conviviam com os filhos legítimos, de baixo do mesmo teto, apesar da contrariedade da Igreja a esse costume, seus praticantes pareciam ter sua consciência pouco afetada. A Igreja defendia que(DEL PRIORE, 1993. P. 50) ao aceitar ocuparem-se com esses frutos de outros ventres, as mães terminavam por aceitar outras formas de convívio sexual que a Igreja não admitia.

A convivência com os filhos ilegítimos do marido com suas
escravas passou a ser algo constante na colônia

A história da maternidade resultante da sedução de mulheres sós, de estupros e de relações sexuais pré-matrimoniais seguidas seguidas de fuga de noivo, sendo essas mulheres transformassem mães solteiras, é um ponto importante para a compreensão da condição da mulher no campo materno. As frustrações, a humilhação advinda do abandono do companheiro, as angustias da gestação terminavam por constituir uma boa oportunidade para que a Igreja pudesse vender a idéia das vantagens do casamento. E muitas dessas mulheres correspondiam ao desejo do matrimônio, pois este era considerado como sinônimo de sonhada segurança e estabilidade econômica e moral: "Uma vez efetuados os passos da conduta amorosa, as mães solteiras invocavam, na medida de suas conveniências, valores como ' virgindade roubada' ou 'quebra de promessas de esponsais' para passar de um degrau ao outro: da sedução ao casamento. A Igreja então, recompensava as 'arrependidas' com processos eficientes e rápidos que garantiam o seu objetivo institucional: difundir o casamento, dentro do qual se poderia 'educar cristãmente os filhos' ".( DEL PRIORE, 1993. P. 70)
Explicita-se assim, a forma pela qual muitas mulheres esperavam criar seus filhos com a segurança mínima que só o casamento poderia garantir.
 
III - Maternidade negada: a opção de muitas mães pelo abandono, aborto ou infanticídio.
As conseqüências realmente graves da maternidade irregular eram de ordem sócio-econômica e não moral. A pobreza e dificuldades da vida material uniam de mulheres brancas pobres a escravas, confirmando a necessidade feminina de estabilidade e proteção. Para muitas mães solteiras, sem família nem companheiro, o filho passava a significar 'mais uma boca para alimentar'. Tal cenário de extrema pobreza e luta pela vida é um dos motivos que obrigava muitas mães a destinar seus filhos ao abandono ou ao infanticídio, esses dois em maior número que o aborto.
Os diferentes ritmos de crescimento do mundo colonial repercutiam fortemente na condição de vida das crianças. Enquanto no campo, onde as transformações eram lentas, o abandono raramente ocorria e os enjeitados acabavam sendo adotados como 'filhos de criação'; na cidade, espaço de aceleradas transformações e desequilíbrios, não havia lugar para acolher os pobres e dar assistência ao enorme número de crianças enjeitadas.
 

Roda dos Expostos do Convento
de Santa Clara do Desterro,
em Salvador (BA)
"No século XVIII, houve um crescimento da população livre e pobre e junto com ele o abandono de crianças, ao desamparo pelas ruas e lugares imundos, segundo os Anais do Rio de Janeiro de 1840." (DEL PRIORE, 1989. P. 48) Nas cidades, coube às câmaras e às Santas Casas o trabalho de acolhimento e criação de enjeitados. Nas Santas Casas instalava-se a Roda dos Expostos, onde os bebês eram deixados.
Cabe-nos agora explorar mais de perto o comportamento feminino em relação ao abandono dos filhos, fazendo algumas perguntas; quais motivos levariam mães a abandonarem seus filhos? De que forma é possível conhecer um pouco de sensibilidade materna nos séculos passados através da história do abandono de crianças? Qual é o significado do abandono e o que está por trás dessa atitude?

Uma interpretação bastante comum consiste em atribuir o abandono a motivos morais. Entre a população branca, o comportamento feminino dentro dos padrões morais estabelecidos era permanentemente fiscalizado pela Igreja e pela comunidade. Assim, "um filho ilegítimo(de mulheres negras e mestiças) não desonrava a mãe no mesmo grau de uma mulher branca."( DEL PRIORE, 1989. P. 198.) dessa forma, a Roda dos Expostos procurava evitar os crimes morais, protegendo as mulheres brancas e solteiras dos escândalos, ao mesmo tempo que oferecia alternativa à crueldade do infanticídio.
Portanto, é de se supor que muitos enjeitados no Brasil colonial fossem resultado das relações ilícitas de mulheres de condição social elevada, para as quais era fundamental a manutenção da honra. No entanto, é necessário lembrar que a mãe solteira ou concumbina acabou sendo aceita nas cidades e vilas do século XVIII. Assim sendo, "o modelo patriarcal que contrapõe o recato da mulher branca à promiscuidade das escravas é uma grosseira simplificação da realidade".( DEL PRIORE, 1989. P. 199)
Uma Segunda interpretação à prática do abandono, talvez a de maior ocorrência de todas, consiste no abandono como resultado da miséria e indigência das mães.
A escravidão e a miséria deixaram como herança séculos de instabilidade doméstica, o que levou as mães das camadas populares a improvisarem até mesmo as formas de amor e de criação dos filhos: uma prática comum entre as mães pobres consistia na distribuição de seus filhos entre parentes, amigas ou comadres para os criarem
Do ponto de vista oficial, mães que enviam filhos a outra família pareciam insensíveis e egoístas. No dia-a-dia, porém, a realidade era outra e não se via no abandono uma prova de falta de amor, mas sim era tido como um verdadeiro gesto de proteção e ternura, frente às enormes dificuldades materiais da mãe, que de forma alguma poderia garantir um futuro promissor aos filhos.
Portanto, o abandono está ai justificado como uma forma paradoxal de manifestação de amor maternal.
Casos de abandono menos freqüentes eram aqueles resultantes da morte dos pais, relacionados à insalubridade do meio urbano, maior densidade populacional, presença de muitos pobres mal alimentados e de estrangeiros portadores de doenças, acarretando altas taxas de mortalidade.
 

Detalhe de janela na Igreja e Convento
de Santa Teresa, no Rio de Janeiro,
com grade e pontas de lança para
proteger a "integridade" das internas
Uma Quarta interpretação seria a chance de o enjeitamento funcionar como forma de controle de natalidade. Assim, o abandono seria uma solução para se manter o número ideal de filhos. No que diz respeito à legislação referente ao abandono, é importante lembrar que enjeitar o filho não constituía crime, nem implicava a perda da posse: as mães, caso quisessem, poderiam recuperar o filho deixado na Roda ou entregue a outra família. O mesmo não se pode afirmar quando o assunto é infanticídio e aborto, considerados criminosos, eram tidos também como práticas heréticas e demoníacas.
Proponhamo-nos agora uma pergunta: a existência de numerosas instituições destinadas a enjeitados não revelaria, de certa forma, um certo descaso de autoridades metropolitanas em relação ao abandono? Poderíamos dar resposta afirmativa à pergunta, uma vez que a tal posição pode ser acrescentada a permanente falta de recursos adequados à criação das crianças nas casas de misericórdia, além da absolência das câmaras encarregadas do encaminhamento dos enjeitados.
Os índices de mortalidade dos enjeitados eram assustadores e muitos médicos consideravam as condições das Santas Casas e o descaso das criadeiras como verdadeiros motivos da morte em massa das crianças.
A negação da maternidade implicava na multiplicação de criadeiras gananciosas que empregavam desastrosas técnicas de amamentação artificial, levando milhares de bebês à morte. Também não eram raros os casos em que as criadeiras obrigavam as crianças à prestação de serviços: afazeres domésticos, tratamento de animais de pequeno porte, trabalho na roça.

IV- Conclusão
A análise da condição maternal da mulher no Brasil colonial, principalmente da mulher das camadas populares, inserida num cenário de extrema pobreza e luta pela vida, situação que se torna ainda mais crônica se a ela se soma a ausência de maridos e companheiros, deve desmistificar a relação da maternidade irregular e da ilegitimidade com a falsa idéia de promiscuidade atribuída à massa de marginalizados do mundo colonial.
A grande maioria das mulheres na colônia, á mercê da opressão de um sistema social de submissão e nula ajuda institucional, via a maternidade inevitavelmente, como uma sobrecarga. "No Brasil, ao dizer ' família' vale ler ' mães sós' que compunham a grande maioria, sobretudo nas classes subalternas"( DEL PRIORE, 1989. P. 55). A opção para tais mulheres era o abandono, o aborto ou o infanticídio.
 
BIBLIOGRAFIA
DEL PRIORE, Mary (Org.). História das mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto, 1997.
DEL PRIORE, Mary. A mulher na história do Brasil: raízes históricas do machismo brasileiro, a mulher no imaginário social, "lugar de mulher é na história". São Paulo: Contexto, 1989.
DEL PRIORE, Mary. Ao sul do corpo: condição feminina, maternidades e mentalidades no Brasil colônia. Rio de Janeiro: José Olympo, 1993.
SAMARA, Eni de Mesquita. A família brasileira. São Paulo: Brasiliense, 1983.
SILVA, Maria Beatriz Nizza da. Sistema de casamento no Brasil colonial. São Paulo: T. A. Qeiroz, 1984.
SOUZA, Laura de Mello e (Org.). História da vida privada no Brasil: Cotidiano e vida privada na América portuguesa. São Paulo: Cia. das Letras, 1998. Vol. 1.
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O MITO DO AMOR MATERNO

O MITO DO AMOR MATERNO

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Dissertação sobre o mito do amor materno
Em “Um amor conquistado – o mito do amor materno”, Elizabeth Badinter nos mostra de maneira muito clara que o amor materno inato é um mito. Não é “dado”, mas sim, como deixa antever o título da obra, “conquistado”.

Porém, acreditamos em nosso imaginário que tal amor seja algo natural. Algo que nasce com as mulheres, verdadeiro apanágio feminino. Fala-se até de “instinto materno”. E coitadas daquelas que não o têm! Sofrem um certo preconceito, pois falta-lhes qualquer coisa de fundamental!


Essa convicção se dá basicamente por duas razões.

A primeira é devido à imposição feita pela cultura, responsável pelo desenvolvimento do modelo de amor materno conhecido atualmente e com o qual temos convivido desde o século XIX.


A segunda, em uma relação de causalidade circular com a anterior, deve-se à necessidade de se idealizar a relação mãe-filho, idealização que obedece ao desejo de união perfeita, fantasia de completude que protege o indivíduo das ansiedades e medos mais primitivos de separação, abandono e perda.

Desse modo, a mãe é concebida como alguém puro a quem são atribuídos apenas sentimentos nobres de acolhimento, abrigo e continência no que diz respeito a sua cria. A criança, é vista como um ser que se satisfaz total e plenamente com uma relação fusional com ela satisfazendo-a do mesmo modo. (Um exemplo do valor dado à tão sonhada relação, são as expressões artísticas cristãs que retratam sempre a Madona olhando o Menino Jesus com enlevo e este, por sua vez, retribuindo com adoração).


O caráter ambivalente e contraditório desse modelo de vínculo que reúne sentimentos de aprisionamento e possibilidade de individuação, será enfrentado só bem mais tarde na vida, com a entrada do terceiro na relação diádica composta por mãe e filho, cujo primeiro representante e protótipo para os demais é o pai.


Contudo, o amor materno como o conhecemos atualmente, é aquisição bem recente. Os estudos trazidos por Badinter nos fazem ver que nem sempre foi assim. A mãe tinha mais uma função biológica que afetiva, ficando as crianças ao cargo de amas-de-leite que lhes garantiam a sobrevivência física, o suporte emocional e humanização.


A crença do amor materno instintivo, imaculado e incondicional terá importantes conseqüências no exercício da convivência entre pais e filhos, na visão de guarda e na dificuldade que se observa quando se apresentam modificações nos parâmetros de convívio estabelecidos como “naturais e corretos”, como veremos mais adiante.


Todo afeto para se dar precisa de proximidade física e emocional. Deve ser conquistado com e na convivência. É na intimidade das relações construídas no cotidiano que germina, cresce e frutifica.

E o amor materno não foge a essa regra. Não é decorrente, como se crê, da ação de algum instinto. É afeição que, como qualquer outra, necessita de reciprocidade desenvolvida em um relacionamento estreito e contínuo que assegure confiança e familiaridade aos que dele se nutrem.

Se o amor não é dado, não está garantido de antemão, não é fruto de geração espontânea, mas ao contrário, demanda empenho, cuidado e investimento dos que integram uma relação amorosa qualquer que seja ela – entre mãe e filho, entre amantes, ou entre amigos –, por qual motivo vê-se ainda com tantas reservas a atribuição da guarda dos filhos ao pai quando de uma separação conjugal? Talvez devido ao preconceito, medo de contrariar a prática usual, ou mesmo desinformação...

As noções que temos de como as funções e papéis sociais devam ser exercidos é resultado do que Pichón-Rivière (1985) denominou de representação da norma social designada. “[...] um imaginário social dado por idéias, imagens e estereótipos, isto é, representações simbólicas compartilhadas [...] com certa homogeneidade pelas pessoas da época histórica de que se trata”.

Devido a ação desses núcleos de significados imaginários que funcionam como lentes ou crivos de decodificação de comportamentos, alterar a visão de mundo e dos valores sobre os quais assentam as experiências, demanda um tremendo esforço e provoca desconforto não só naqueles que ousam mudar, mas também nos que os cercam.


Esse legado inconsciente e o mito do amor materno são em grande parte responsáveis por um lado, pelas mães que “deixam” a guarda para o pai, ou perdem a guarda sentirem-se, ou serem vistas como mães incompetentes, abandonantes e más e, por outro, os pais que reclamam a guarda, ou a “tiram” das mães sentirem-se, ou serem vistos como indivíduos cruéis e desumanos.


Ora, os atributos de afeto antes referidos não são prerrogativas do amor materno. Não estão adstritos a ele.

O amor paterno também é semeado, alimentado e aprendido no trato diário com os filhos. Nas oscilações da convivência, em meio à ambivalência, é construído e sustentado. Nada difere em possibilidade, da magnitude do amor materno.
Considerar que ambos os “amores” sejam conquistados, portanto legítimos e de igual qualidade não equivale a dizer que não haja diferenças entre eles. Afeto e função maternos e paternos têm suas especificidades por mais difícil que seja estabelecer distinções atualmente.

O que a criança precisa é de quem a olhe e veja como alguém de importância emocional, para nessa mirada poder reconhecer-se como alguém merecedor de amor e “amável”.

A cultura tem protegido as mulheres dando-lhes apoio, guarnecendo-as de modelos e ensinando-as a ser mães. O mesmo não tem se dado em relação ao pai. Abastecê-lo de modelos de paternidade próxima e emocionalmente responsável é desafio para todos nós, homens e mulheres.

Eliana Riberti Nazareth*
liananazareth@uol.com.br

Bibliografia: "Um amor conquistado: O mito do amor materno por Elizabeth Badinter, editora Nova Fronteira,1985, Rio de Janeiro,
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Relação Mãe - Bebê

Relação Mãe - Bebê  
 http://bbel.uol.com.br/upload_2009/conteudo/mae_bebe1_25911015453931.jpg
Silvana Sacharny
 
"Françoise Dolto: "Cada um de nós, ao nascer, é a linguagem do desejo dos pais". 
 

As circunstâncias em que uma nova vida se cria; a concepção, a vivência uterina e o nascimento são os primeiros indicadores do processo de desenvolvimento dessa vida.
Desde a concepção até o nascimento, o bebê está numa relação simbiótica com a mãe, nesse estado se encontram todas as potencialidades do seu "vir a ser", fixadas nos seus genes; a memória da evolução filogenética do homem e a sua constelação individual (a herança da sua ascendência direta, o patrimônio genético dos pais).
Partindo da unidade corpo-psiquê, desde a concepção de uma nova vida, não se poderá mais considerar essa nova vida à distância, mas pensar esta vida que se anuncia em todas as suas potencialidades. Representa um ser que pede para ser reconhecido, encontrado e amado.
Muito cedo, trocas importantes intra-útero se estabelecem entre a mãe e o seu bebê, a vivência no período pré-natal imprime no ser o que podemos chamar de memória sensorial.
A partir da natureza orgânica, a mulher ( em condições normais) pode receber a nova vida, fazê-la amadurecer e sustentá-la afetivamente. No estado de fusão orgânica, a gestante percebe o bebê praticamente o tempo todo, porém sentir a movimentação não é suficiente para de fato estar em contato com a sua gestação. A construção da função materna se inicia nesse período, é fundamental a vivência de sua capacidade receptiva, o aprofundamento da qualidade de contato afetivo. Faz-se necessária a integração entre a disponibilidade psíquica e corporal para que a mulher possa percorrer uma trajetória ambígua de afetos, de sensações, e expandir sua consciência corporal feminina. Desta forma, as condições para um bom parto e nascimento são bastante favorecidas.
Desde as primeiras horas de vida o bebê é um ser de comunicação. O desenvolvimento do bebê, através da comunicação sensorial ( auditiva, visual, olfativa, gustativa e tátil) é favorecido pela forma com que a mãe o estimula, carrega, assegura e escuta na expressão de suas necessidades, de suas mensagens. A comunicação se estabelece na origem através da linguagem corporal, a função psíquica se apóia e se desenvolve a partir da vivência corporal.
Na relação original mãe-bebê, o contato útil da mãe no bebê tem como funções: a estimulação orgânica (favorecer o deslanchar de atividades novas como a respiração, a excreção-digestão e as defesas imunitárias), a comunicação afetiva ( instaura o sentimento de segurança, confiança, proteção, reconhecimento da existência ) e prepara o acesso à linguagem.
Esse contato conduz o bebê, aos poucos, a diferenciar uma interface-como uma membrana - que permite a distinção do externo e do interno, trazendo a experiência de um continente. Esta vivência, no quadro de uma relação segura, garante ao bebê a integridade do seu envelope corporal.
A pele é o mais extenso órgão dos sentidos do corpo, e o sistema tátil é o primeiro sistema sensorial a se tornar funcional. Didier Anzieu nos fala sobre o "Eu - pele" baseado na importância da integridade do envelope corporal; elemento ao mesmo tempo de ordem orgânica e fantasmática, que visa a envelopar o aparelho psíquico e exerce a função de continente. Esta função é desenvolvida através de cuidados maternos, com toques investidos de afeto. A sensação-imagem da pele como um saco é estimulada através desses cuidados com o corpo do bebê, apropriados às suas demandas.
A tendência do desenvolvimento afetivo é a passagem do estado de indiferenciação ao registro da diferenciação. O bebê evolui de uma dependência absoluta em direção a uma dependência relativa, depois para a autonomia. Aos poucos, uma fronteira se cria separando o interno do externo; a integração e o sentimento de unidade se posicionam.
A relação original mãe-bebê se dá igualmente através de outros mediadores da comunicação, tais como o envelope visual ( a partir do contato visual) e o envelope sonoro ( a partir do "banho" de palavras, cuja tonalidade da voz materna, seu ritmo, provoca no corpo do bebê uma ressonância tônico-emocional que vai, aos poucos, preparando e estimulando a criança na sua própria expressão verbal).
A função tônica do corpo é também uma função primitiva e essencial de comunicação, de troca. O corpo do bebê, através de suas manifestações emocionais, estabelece com o ambiente que o envolve um diálogo tônico. O tônus muscular é a qualidade de tensão involuntária que expressa os diferentes afetos. O estado tônico é um modo de relação. A tonicidade ou a vivência tônica é ligada inseparavelmente à vida afetiva original do bebê, é o tecido com o qual ele se liga ao mundo e primeiro à mãe. O espaço postural do bebê se enraiza no espaço corporal da mãe. Os movimentos expressivos que traduzem conforto/desconforto, demanda/satisfação, prazer/desprazer, vão se moldar, criando um código corporal, em função das reações corporais positivas ou negativas do meio maternal.
Quando estas funções são preenchidas de forma satisfatória, o bebê se sentindo compreendido e atendido nas suas demandas, pode então construir um envelope de bem-estar, narcisicamente investido.

Setembro 1988.

Bibliografia:

1. Wallow Henri - "Les origines du caractère chez l'enfant" ( Quadrige/PUF)
2. "L'être touché, psychothèrapie et toucher" - Adire n.6 avril, 1991 - Revue d'Analize Psycho-Organique
3. Anzieu Didier - "Le moi-peau" - Dunod. 1985
4. Mantagu Ashley - "Tocar - O significado humano da pele" - Summus Editorial

Resumo do currículo da autora:
Psicóloga com formação em psicoterapia corporal em Análise Psico-Orgânica pela Escola Francesa de Análise Psico-Orgânica e especialização em Psicologia Clínica pela Universidade Sorbonne - Paris. Atua na área clínica e desenvolve um trabalho com gestantes. É colaboradora na Formação de Base de Psicoterapeutas em Análise Psico-Orgânica no Rio de Janeiro.
 
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O conflito entre o consciente e o inconsciente na gravidez não planejada

O conflito entre o consciente e o inconsciente na gravidez não planejada

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Miriam Tachibana*; Laíse Potério Santos; Claudia Aparecida Marchetti Duarte**
* Pontifícia Universidade Católical de Campinas
** Universidade Paulista/Sorocaba

RESUMO

A questão do desejo acerca da gravidez demanda maiores investigações, visto que pode ocorrer de os discursos manifesto e latente não estarem em sintonia, o que culminaria na ocorrência de uma gravidez inconscientemente desejada, mas conscientemente não planejada. Dessa forma, este estudo objetivou investigar quais seriam os motivos latentes, na gravidez não planejada. Para tanto, contou-se com a participação de doze gestantes, sendo o instrumento utilizado a entrevista psicológica. O procedimento de coleta aconteceu em dois encontros, com cada uma das participantes, sendo que as informações foram analisadas qualitativamente. Os resultados obtidos revelaram que em alguns casos, o motivo consciente contrário à irrupção da gravidez não planejada era justamente a motivação que inconscientemente levava a gestante a desejar engravidar.
Palavras-chave: Gravidez, Desejo, Psicanálise, Gestante, Maternidade.


ABSTRACT
The theme of the desire on getting pregnant demands more investigations, once conscious and the unconscious’s desire might necessarily linked, when unplanned pregnancy is concerned. To investigate the unconscious reasons on getting pregnant, we interviewed 12 pregnant women. The data was collected in two meetings and it was analyzed psychoanalytically and by certain categories. The obtained results revealed that, in some cases, the conscious reason against planning the pregnancy was exactly the reason why the patient had the unconscious desire on getting pregnant.
Keywords: Pregnancy, Unconscious desire, Psychoanalysis, Pregnant, Motherhood.




I. Introdução teórica
Demanda versus desejo pela gravidez
De acordo com Bortoletto (1992), se na década de 50, as mulheres tinham uma função materna bem definida, a qual se sobrepunha dentre todos os papéis tidos como femininos, a partir da década de 90, tais valores passam por uma reestruturação. A maternidade passa a se configurar como uma opção que pode ser adiada, e até mesmo descartada.
Segundo Azambuja (1986), pode-se notar que com o questionamento crítico a respeito do instinto materno e da concepção idealizada de maternidade, as mulheres passam a ser autorizadas a viver autenticamente a produção de seus desejos.
Mas toda mulher tem clareza de quais são seus desejos? De quais são suas demandas? Do que representa seu verdadeiro desejo e do que representa uma vontade oriunda de um discurso socializador?
Debray (1988) responde que em alguns casos, a mulher consegue identificar quais são seus verdadeiros desejos, mas na maioria das vezes, não consegue realizar essa tradução. Isto ocorre, segundo a autora, porque há uma diferença (que será adotada neste estudo) entre aquilo que se deseja e aquilo que se demanda. O desejo, de acordo com a abordagem psicanalítica, corresponde unicamente à esfera inconsciente, enquanto a demanda seria uma vontade pertencente à esfera consciente. É por esta diferenciação que a questão do desejo pela gravidez requer maiores estudos, pois apesar de os métodos contraceptivos trazerem às mulheres o sentimento de que dominam perfeitamente sua fecundidade, com a vontade de engravidar sendo realizada apenas no dia e na hora que conscientemente escolherem, há a complexidade da motivação inconsciente quanto à gestação, que muitas vezes culmina nas chamadas “gravidezes não planejadas”.

Interdito inconsciente à gestação
Apesar de este não ser o principal foco deste trabalho, faz-se imprescindível haver um espaço para a discussão sobre o conflito que se dá quando a mulher conscientemente refere vontade em gestar, mas inconscientemente apresenta interditos que se opõem a esse movimento. Isto porque esse quadro consiste também em uma problemática resultante dos entraves entre os discursos manifesto e latente no que tange ao querer ser mãe.
Bastos (1995) destaca que comumente as mulheres com problema de infecundidade passam a viver tendo suas vidas sexuais voltadas ao objetivo de conseguirem engravidar. São mulheres, segundo a autora, que estão tão conscientemente obstinadas em engravidar, que se poderia afirmar que se tornam “doentes” da gravidez. O sentimento que prevalece é o de uma insuportável ferida narcísica que as fazem se sentir menos mulheres, principalmente mediante àquelas que possuem filhos.
Langer (1986) afirma, entretanto, que tais mulheres com dificuldade em engravidar, ou ainda, em levar uma gravidez até o seu final, apesar de referirem em nível consciente forte demanda em se tornarem mães, apresentam paralelamente muita angústia quanto à concretização desse fenômeno. Isso ocorre, segundo Debray (1988), porque às vezes a vontade consciente por um filho faz-se tão forte que acaba cegando os pais, calando-lhes qualquer expressão inconsciente de ambivalência, que retornará pelas vias somáticas, entravando ativamente a fecundidade. Soifer (1980) chega a afirmar que o psiquismo pode atuar de forma somática, produzindo múltiplos mecanismos para se evitar a concepção, como o vaginismo, as inflamações vaginais e uterinas, aumento do pH, patologia ovariana, dentre outros.
Faz-se importante destacar que assim como a gestante de uma gravidez não planejada pode vir a aceitá-la, ao longo da gestação a mulher que apresenta problemas gestacionais, por conta de algum interdito inconsciente, pode vir a resolvê-lo e apresentar uma gravidez sem grandes transtornos.

Desejo pela gestação
Segundo Fernandes (1988), se uma gravidez ocorre é porque existia na mulher um desejo inconsciente de ser mãe, independentemente se o discurso manifesto era condizente ou não com essa motivação. Szejer e Stewart afirmam que justamente pelo fato de o desejo não pertencer à esfera do consciente, dá-se um interjogo entre vontade (consciente) e desejo (inconsciente), o que pode fazer com que uma mulher venha a gestar, a despeito de seu discurso manifesto referir o contrário.
Pode-se afirmar – de boa fé – que se deseja um filho, e inconscientemente não desejá-lo, por questões que escapam e dizem respeito à história particular de cada um. Pode-se também “fazer de tudo” para não ter um filho, porque isso não é razoável, não é o momento, a situação não é adequada, e simplesmente fazê-lo porque o desejo inconsciente é mais forte que todas as decisões racionais. Às vezes acontece que o desejo inconsciente se articula com a vontade consciente. Por exemplo, quando uma gravidez programada acontece e se desenvolve conforme o previsto. Mas, também, ocorrem conflitos entre o desejo inconsciente e a vontade consciente (1997, p. 56).
Assim, conforme Chatel (1995), não existe gravidez que ocorra ao acaso, sendo a fecundação tida como resultado de uma somatização. Dolto (1984) complementa que a mulher pode receber um filho sem tê-lo querido conscientemente, pois o apelo de seu corpo, isto é, seu querer inconsciente de fecundidade, estava inscrito em si mesma sem que se desse conta. Segundo Soifer (1980), quando a mulher engravida é porque seus sentimentos ambivalentes de querer e não querer ter um filho não se encontravam na mesma proporção no momento da fecundação, com o desejo pela maternidade superando o terror aos filhos.
Esta questão da motivação inconsciente em engravidar pode ser percebida, de acordo com a autora, nas mulheres que, a despeito de declararem não desejarem engravidar, se esquecem de tomar pílula anticoncepcional, de usar o diafragma ou a camisinha, por exemplo. Szejer e Stewart (1997) analisam como sendo atos falhos, representantes do discurso inconsciente.
De maneira geral, de acordo com Langer (1986), mesmo quando a mulher faz uso de métodos anticoncepcionais e descarta conscientemente, no coito, a possibilidade de vir a engravidar, percebe-se que no nível inconsciente há uma relação entre a aceitação do prazer que seu companheiro lhe oferece e as fantasias de uma gravidez e do parto.
Conforme a teoria psicanalítica, a questão do desejo em ter um filho faz-se inerente a toda e qualquer gestação. De acordo com Debray (1988), nos casos de hiperfecundidade, referentes àquelas mulheres que se encontram seguidamente grávidas, após uma única relação sexual, na verdade a gravidez poderia surgir de forma tão “precipitada” como uma maneira inconsciente de escapar das relações sexuais pouco apreciadas. Segundo a autora, nesses casos é comum verificar que na história familiar da gestante há uma família numerosa, o que daria a explicação inconsciente para suas gravidezes recorrentes.
Ainda conforme Bastos (1995), pode-se notar o desejo da gravidez em mulheres vítimas de estupro, que por vezes nem ocorreu em períodos férteis. A explicação inconsciente para tal gestação, fruto de um ato de violência, seria a busca de uma resposta de pulsão de vida (neste caso, seria o bebê), que oferecesse à mulher menor perigo de morte.
Faz-se importante destacar que a despeito de uma gravidez “não planejada” em geral trazer principalmente sentimentos de rejeição, a reação inicial não se cristaliza para sempre: uma atitude inicial de rejeição pode dar lugar a uma atitude predominante de aceitação e vice-versa (Maldonado, 1988). O que comumente ocorre, segundo Valente (1989), é que a gravidez não-planejada passa a ser encarada de maneira passiva, por meio do discurso estereotipado: “já que estou, vai continuar”.
Ao se pensar que toda gravidez, segundo Caplan (1964), é vivida de maneira crítica – uma vez que tal etapa na vida da mulher desperta vivências extremamente primitivas, que até então dormitavam –, pode-se pensar o quanto essa crise torna-se maximamente presente em uma gestação que irrompeu inesperadamente.
Levando em consideração o exposto até agora, intentou-se realizar um estudo que tivesse os seguintes objetivos: 1) descrever como ocorreu a gravidez, a despeito de seu não planejamento; 2) investigar as motivações inconscientes pela gestação não planejada; e 3) identificar os motivos conscientes contrários à gestação.

Método
A amostra foi composta por apenas doze gestantes, uma vez que a pesquisa foi realizada nos moldes de um estudo de cunho qualitativo. Fernandes (1988) destaca que o conhecimento sobre as pessoas, em um estudo qualitativo, pode se dar até mesmo por intermédio de um único caso, uma vez que o objetivo é o de observar quando e como aparecem os fenômenos, sem uma preocupação com questões estatísticas e de freqüências. Os critérios de seleção para a composição da amostra foram:
1) As gestantes deveriam estar com a idade gestacional dentro do segundo trimestre de gravidez (o que corresponderia ao período entre doze semanas a vinte e quatro semanas). A escolha por esta etapa da gravidez deve-se ao fato de que teoricamente, no último trimestre gestacional, a ocorrência da gravidez encontra-se elaborada, e no primeiro, é esperado que toda e qualquer gestação, independentemente se planejada ou não, seja vivida de maneira ambivalente (Szejer e Stewart, 1997).
2) No prontuário das pacientes deveria estar escrito, no perfil realizado pelo serviço social, que as participantes haviam referido que a gravidez não havia sido planejada;
3) As pacientes não poderiam estar em acompanhamento psicológico na ocasião da atual gravidez. Esta exigência justifica-se por se entender que um trabalho analítico prévio poderia interferir na apreensão do fenômeno, haja vista que os conflitos emergentes da ocorrência da gravidez não planejada poderiam ter sido trabalhados analiticamente.
Sendo assim, este estudo contou com a participação de doze gestantes, pacientes de um hospital maternidade, que se consultavam em um dos seis ambulatórios de pré-natal da instituição. Dessa forma, foram coletados dados com duas pacientes de cada um dos pré-natais, havendo um cuidado para que cada uma tivesse um diagnóstico diferenciado, em relação aos das outras, no intuito único de se diversificar a amostra.
O instrumento utilizado foi a entrevista psicológica. A escolha por tal instrumento deveu-se ao fato de o mesmo se configurar em uma maneira eficaz de se apreender os conteúdos latentes trazidos pelas informantes. Etchegoyen (1987) atenta que, ao contrário da entrevista padronizada, que visa meramente colher dados informativos, a entrevista psicológica procura ver como um indivíduo funciona, e não como ele diz que funciona.
Dessa forma, foram realizadas entrevistas psicológicas, segundo o método clínico psicanalítico, levando-se em consideração os atos falhos, lapsos, chistes, eventuais relatos de sonhos e, inclusive, os sentimentos de contratransferência da pesquisadora.
Segundo Bleger (1979), apesar de muitos autores considerarem erroneamente o fenômeno da contratransferência como uma simples percepção do analista, deve-se pensar em tal mecanismo como um indício de grande significado e valor sobre o que se passa na esfera inconsciente do paciente. Segundo o autor, quando o entrevistador apresenta uma boa preparação e equilíbrio mental, a contratransferência pode ser utilizada com alto grau de validez e eficiência, servindo de mais um instrumento técnico de observação e compreensão.
Para a elaboração do roteiro semi-aberto da entrevista psicológica, foram utilizadas as reflexões de Maldonado (1988). Segundo a autora, para se compreender o sentido da gestação para uma mulher, deve-se levantar temas relacionados à história pessoal da gestante (história psicossexual e o passado de suas irmãs e mãe); o contexto existencial da gravidez (se dentro ou fora de um vínculo estável, a idade materna, a história de gestações da mulher); seu contexto sócio-econômico e as características da evolução desta gravidez. O roteiro elaborado foi submetido à testagem preliminar com duas pacientes que realizavam pré-natal na instituição em questão, e que atendiam aos critérios de seleção.
Para a coleta de informações, foram realizados dois encontros com cada uma das entrevistadas, os quais ocorriam quando elas vinham ao hospital para as consultas do pré-natal1. A escolha pela realização de dois encontros com cada paciente deve-se não apenas ao fato de que o roteiro de entrevista era demasiado extenso para ser contemplado em um único encontro, mas principalmente no intuito de promover uma melhor investigação.
Após a transcrição das vinte e quatro entrevistas relativas às doze pacientes, o material foi submetido à análise interpretativa. A abordagem teórica escolhida foi a psicanalítica, porque de acordo com Pinto e Vaisberg (2001), tal abordagem permite justamente que se tenha acesso aos fenômenos inconscientes, uma vez que seu pressuposto revolucionário é a crença radical de que não importa quão louca, estranha ou ilógica uma determinada conduta possa aparentar, ela é portadora de um sentido emocional, não havendo, portanto, limites para a compreensibilidade do fenômeno. Sendo assim, para a interpretação dos discursos trazidos pelas pacientes, levou-se em consideração os lapsos de linguagem, os sonhos, os chistes, dentre outros.
Assim, primeiramente, a pesquisadora2 fez suas interpretações pessoais a respeito de suas vivências com cada uma das pacientes, levando em consideração, inclusive, seus sentimentos de contratransferência. Após a realização da análise interpretativa individual, foi realizada discussão de cada um dos casos em supervisão, no intuito de ampliar a atividade interpretativa. Sabe-se que não apenas na realização da atividade de pesquisa, mas também na das atividades clínicas, há a necessidade contínua de supervisão de casos, no intuito de se verificar se há outras hipóteses a serem levantadas, que em um trabalho isolado podem passar desapercebidas.
Após esta primeira etapa do procedimento de análise, foi utilizado o método “Análise de conteúdo”, proposto por Bardin (1977), segundo o qual devem ser realizadas leituras exaustivas, até que todo o material registrado seja efetivamente apreendido. Quando isso ocorre, faz-se possível a emergência de categorias, espontaneamente, a partir do agrupamento de conteúdos similares.

Resultados e discussão
A partir da leitura e releitura dos relatos de cada uma das entrevistas, bem como de suas respectivas interpretações analíticas, emergiram algumas categorias, com base no agrupamento de conteúdos similares trazidos pelas pacientes entrevistadas. Sendo assim, serão apresentados, a seguir, os eixos temáticos emergentes, com breves descrições.

Categorias
a) Ocorrência da gestação
Categoria na qual encontram-se as sub-categorias referentes à forma como se procedeu a gestação não planejada, bem como os sentimentos que a acompanham no momento atual.
a.1) Lapsos na contracepção
Sub-categoria na qual são apresentados os atos falhos na contracepção, que deram margem para que a gestação ocorresse:
“A gente usava camisinha, mas não era sempre, não. Se for pensar bem, até que demorou bastante, né, pra eu acabar engravidando” (Participante 5).
“Esqueci de tomar a pílula quando era pra ter iniciado a nova cartela. Eu só fui me lembrar uma semana depois. Daí, nem adiantava mais ficar tomando a pílula, né? Ficamos esperando pra ver se a minha menstruação descia, e daí...” (Participante 8).
Todas as participantes engravidaram por algum descuido em relação ao uso de métodos contraceptivos. Todas referiram ter deixado de usar, por iniciativa própria, métodos contraceptivos, o que revela o desejo em engravidar. Pensa-se que por diversos motivos, particulares a cada uma delas, não foi possível verbalizar conscientemente o desejo pela gravidez; mas ao se observar como esta ocorreu, vê-se que inconscientemente tais gravidezes foram, na prática, planejadas. O planejamento pode não ter se dado em nível manifesto, mas conforme se observa, ocorreu por meio de acting outs.
Szejer e Stewart (1997) analisam os esquecimentos em tomar a pílula anticoncepcional ou em usar a camisinha, por exemplo, como sendo atos falhos, representantes do discurso inconsciente. Debray (1988) destaca que motivações inconscientes análogas podem ser encontradas nas mulheres que referem não suportar uma determinada pílula, julgada muito forte ou muito fraca, bem como as que reclamam do uso do DIU (dispositivo intra-uterino) como provocador de dores abdominais inexplicáveis ou de infecções repetitivas.
a.2) Sentimentos de ambivalência
Sub-categoria referente às posturas ambivalentes trazidas pelas pacientes, que ora demonstravam aceitação, ora demonstravam rejeição pela gravidez:
“Quando eu peguei o resultado, fiquei feliz, mas fiquei triste. Não sei explicar... Eu não fiquei arrasada, mas também não pulei de alegria...” (Participante 5).
“Não planejei engravidar, mas sabe quando, no fundo, você quer?” (Participante 11).
Todas as participantes trouxeram sentimentos ambivalentes em relação à gravidez. Tal fato já era de se esperar, uma vez que a ambivalência, conforme já discorrido previamente, faz parte de todas as relações humanas, dentre as quais a relação mãe-bebê encontra-se inserida. Entretanto, a despeito de todas as participantes terem manifestado sentimentos ora de aceitação, ora de rejeição, naquela ocasião algumas acabaram se posicionando mais em um estado ou outro. Assim, algumas pacientes revelaram estar elaborando melhor a gravidez (Participantes 3, 6, 9 e 10); outras trouxeram maiores sentimentos de rejeição (1, 5, 7 e 11); e outras não demonstraram uma prevalência entre um ou outro estado (2 e 4).
b) Motivações inconscientes pela gestação
Categoria referente à compreensão analítica dos motivos inconscientes pelos quais a gestante teria desejado engravidar naquele momento. Esta categoria divide-se nas seguintes sub-categorias.
b.1) Desejo associado ao relacionamento conjugal
Sub-categoria que leva em consideração o desejo da gestante em engravidar, buscando fortalecer o vínculo amoroso:
“Enquanto eu fico em casa, passando mal, ele fica, lá, no bem bom, com ela (namorada do pai do bebê). Eu falo, pra ele, que eu não engravidei de propósito pra ele ficar comigo. Mas que, agora que estou grávida, ele tem que ficar cuidando do bebê, né? Não é por mim, mas pelo bebê” (Participante 1).
“A gente sempre brigou muito, porque ele (namorado da paciente) é ciumento e eu sou insegura mesmo (...) Agora, com a gravidez, já me sinto mais segura... Sei que o nosso relacionamento não vai acabar, assim, de qualquer jeito...” (Participante 9).
Pôde-se observar que quatro pacientes trouxeram mais declaradamente a fantasia de que, com o evento da gestação, o relacionamento amoroso com os respectivos companheiros viria a se concretizar. De acordo com Eiras (1983), de fato a gravidez pode promover maior integração entre os elementos do casal. Isto porque, conforme com Mondardo e Lima (1998), teoricamente, um filho é resultado da expressão do amor e da união do casal.
Um outro aspecto que deve ser levantado é o de que, dessas quatro pacientes que trouxeram um desejo em gestar associado ao vínculo conjugal, três estavam vivenciando um processo de separação com os respectivos companheiros (Participantes 1, 2 e 12). Pode-se inferir que, nessas circunstâncias, a gravidez teria irrompido não tanto para aprofundar os laços do casal, mas principalmente para salvar a união, às vias de uma desunião. Entretanto, Szejer e Stewart (1997) atentam que muitas vezes o filho que surge de um casal que não se entende bem pode carregar o peso de uma missão reparadora, independentemente de conseguir ou não cumprir esta sua missão.
b.2) Desejo associado à estrutura familiar
Sub-categoria associada ao desejo da paciente em engravidar por algum motivo latente relacionado às suas figuras familiares:
“O A. (namorado da paciente) está curtindo tanto essa gravidez, que às vezes até se esquece um pouco de mim... Ele fala, mexe na minha barriga o tempo todo. Eu acho que ele vai acabar sendo, pro meu filho, o pai que eu nunca tive” (Participante 8).
“Sabe que eu acho que este bebê vai unir meus pais? Eu acho que como eu vou continuar morando com a minha mãe, meu pai vai começar a ir lá na casa da minha mãe – coisa que ele não faz – e os dois vão se reaproximar mais” (Participante 11).
Pôde-se observar que para três pacientes, dentre outros motivos identificados, a questão da dinâmica familiar esteve presente, dando margem para que se pensasse no quanto elas estariam buscando, por meio de suas gravidezes, rever algum conflito referente a seus passados.
Conforme Garcia (2002), o desejo pela maternidade estaria eminentemente associado a uma projeção regressiva, no passado, em uma tentativa de repetir alguma vivência infantil não elaborada. O ato de criação de um novo ser estaria associado diretamente ao desejo em recriar algo do passado. Segundo Langer (1986), quando a mulher consegue desenvolver uma identificação positiva para com o filho, tendo uma boa relação afetiva com ele, há a possibilidade de que supere suas próprias frustrações infantis sofridas em relação às figuras parentais.
b.3) Desejo associado ao estado de saúde
Sub-categoria que engloba o desejo da gestante pela gravidez, no intuito de buscar inconscientemente instinto de vida, perante a pulsão de morte, esta despertada por seu estado de saúde debilitado.
“Eu nem penso muito sobre a minha doença [AIDS]. Eu evito ler panfletos, participar de palestras (...) Eu acho que esse bebê aqui vai me trazer muita alegria, que nem o J.V. (penúltimo filho da paciente), que eu também não estava esperando, mas que foi quem me fez descobrir que eu tinha essa doença. Eu sempre olho pra ele e digo: ‘Bebê, você é a luz da vida da mamãe!!!’” (Participante 4).
“Eu desconfio que foram os remédios que eu estava tomando, por causa do acidente [acidente de carro que deixou a paciente paraplégica], que me fizeram engravidar. Porque os remédios mexiam muito nesta região do estômago, das coxas... Eu acho que foram os remédios que mexeram no meu corpo e facilitaram para eu engravidar” (Participante 12).
Observou-se que cinco pacientes trouxeram, como motivo inconsciente em engravidar, uma associação aos seus estados de saúde. Cada uma delas apresenta uma problemática em seu estado geral de saúde, o que faz com que se levante a hipótese de que tais pacientes, estariam, em nível intrapsíquico, imersas em pulsão de morte. Seguindo esta lógica, pode-se pensar no quanto tais gravidezes inconscientemente lhes representariam pulsão de vida, e até mesmo um atestado de saúde, de normalidade, de vida...
Segundo Fernandes (1988), a maternidade consiste em um compromisso do ego com as forças instintivas de auto-conservação. Dolto (1984) destaca, ademais, que o sentimento primeiro, vivenciado com a experiência da maternidade, relaciona-se ao narcisismo, já que a gravidez, fruto das pulsões auto-conservadoras, seria uma forma de se fazer reconhecida, além de manter-se imortal, por meio de um “fruto” seu.
b.4) Desejo associado à sexualidade
Sub-categoria associada ao desejo inconsciente pela gestação, para a resolução de algum conflito sexual vivido pela gestante.
“A sua primeira vez com um homem, sabe, doeu? (...) É que a minha doeu muito. Muito mesmo. Eu sabia que doía, porque as minhas amigas já tinham me falado. Mas não doeu só na primeira vez. Doeu nas outras. E dói, um pouco, até hoje” (Participante 3).
“Eu acho que ela (mãe da paciente) está me tratando com mais respeito. Antes, ela me tratava como uma menininha boba. Tudo bem que eu dava trabalho mesmo... Eu saía todas as noites; beijava mesmo... Acho que agora ela já me vê, assim, como mulher, sabe?” (Participante 7).
A partir destas vinhetas ilustrativas, vê-se que em duas pacientes, o desejo em gestar esteve associado à temática da sexualidade. Deve-se atentar, entretanto, que a despeito de tais pacientes encontrarem-se agrupadas na mesma categoria, a postura frente à própria sexualidade é bastante contrária em cada uma delas.
No caso da Participante 7, vê-se sua demanda pelo reconhecimento, principalmente por parte da figura materna, de sua sexualidade e de seu papel não mais de “menina”, mas de “mulher”. Sua gravidez representaria que ela tem sexualidade, sensualidade e atividade sexual. Esta temática acerca da sexualidade refere-se principalmente ao universo psíquico do adolescente, que é o caso da paciente.
No que tange à Participante 3, vê-se que seu desejo em gestar fundamentase justamente no movimento contrário: não o de evidenciar sua sexualidade, mas o de “escondê-la”, a partir de uma gravidez. A paciente traz uma vivência sexual dolorosa, provavelmente está associada à violência sexual sofrida há alguns anos. Dentro dessa dinâmica dolorosa, um bebê viria a representar o fruto positivo, dentro de uma esfera tão conflitiva. Segundo Azevedo (2001), as mulheres vítimas de violência sexual costumam buscar saídas para seu drama por uma via sublimatória, a qual lhe trará novamente a sensação de ser um ser humano digno de amor e respeito. Assim, no caso da Participante 3, esta via sublimatória seria a gravidez.
c) Motivações conscientes contrárias à gestação
Categoria referente aos discursos manifestos apresentados pelas gestantes sobre as dificuldades associadas à gravidez tida não-planejada. A categoria foi organizada de tal maneira, que é constituída das seguintes sub-categorias.
c.1) Discurso associado ao relacionamento conjugal
Sub-categoria referente ao discurso consciente apresentado pela paciente sobre a dificuldade da vivência da gestação devida aos conflitos no relacionamento conjugal:
“Já me conformei. Já me consolei. Já aceitei. Eu já passei por isso duas vezes e não vai ser agora que vou desistir (...) Eu não tive a ajuda do meu ex-marido pra criar as minhas filhas; não preciso da ajuda do pai do meu bebê, agora” (Participante 1).
“Ele (pai do bebê) nem me deixou entrar na casa... Falou comigo no portão mesmo, e já começou a berrar: ‘Tomara que o bebê morra! Tomara que você morra também!’” (Participante 2).
Constatou-se que três participantes trouxeram como queixa manifesta ao evento da gravidez, o fato de não estarem sentindo apoio dos pais de seus bebês. Segundo Soifer (1980), o sentimento de aceitação, por parte da gestante, em relação à gravidez varia conforme o reforço ou não do ambiente social imediato, dentre o qual a figura do pai do bebê destaca-se.
Entretanto, deve-se questionar até que ponto os sentimentos de rejeição de seus ex-companheiros pelas gestações, trazidos pelas três participantes, não se referem inconscientemente às suas partes que rejeitam a gravidez. Maldonado (1983) retrata que como o lado do não querer, em relação à maternidade, é tido como errado e inaceitável, muitas mulheres buscam negálo em si mesmas, projetando-os em seus parceiros. Dessa maneira, é como se ela fosse nutrida dos sentimentos bons, enquanto a ele caberia assumir os sentimentos maus.
c.2) Discurso associado à estrutura familiar
Sub-categoria na qual encontram-se os discursos manifestos das pacientes a respeito das dificuldades na vivência familiar após a ocorrência da gestação.
“Eu sempre tive muito medo dele (pai da paciente). Até hoje, eu tenho um pouco de medo dele (...) Eu achei que ele fosse ficar bravo de me ver grávida, porque ia ser a primeira vez que a gente ia se encontrar, mas ele olhou pra mim, passou a mão na minha barriga e disse: ‘Tá barrigudinha, né?’” (Participante 7).
“Ele (pai da paciente) começou a gritar um monte de coisas, dizendo que ia matar o A. (namorado da paciente), que eu tinha manchado a minha família, tendo um filho com um negro...” (Participante 8).
Apenas duas participantes manifestaram mais evidentemente dificuldades em aceitar a gravidez devido a conflitos familiares que daí decorreram. Pode-se pensar que elas tiveram tais dificuldades prioritariamente pelo fato de ambas serem adolescentes. Como se sabe, nessa etapa do desenvolvimento, o indivíduo ainda encontra-se em transição, rumo à fase adulta: não tem ainda autonomia financeira nem amadurecimento emocional suficiente para assumir um evento como o da gravidez, de maneira independente dos familiares.
c.3) Discurso associado ao estado de saúde
Sub-categoria associada ao discurso consciente da paciente sobre as dificuldades em relação à gravidez, devido a seu estado de saúde.
“Uma vez, numa palestra, eu perguntei, pra um médico, se eu, epiléptica, poderia ser mãe algum dia, e ele disse que sim; mas eu sei que é complicado (...) Como vai ser agora, grávida? Eu tenho medo por mim e pelo bebê! Já caí no chão, já me cortei, já me queimei... no meio das crises...” (Participante 5).
“Não era agora que eu queria ser mãe, sabe? (...) Eu estou em cadeira de rodas, mas é por causa da gravidez. Na verdade, eu consigo andar com a ajuda de andador” (Participante 12).
Observou-se que seis participantes trouxeram conflitos manifestos acerca de seu estado de saúde com a gravidez, ou ainda, do estado de saúde do bebê na gestação. Com relação à preocupação quanto ao próprio estado de saúde (mais presente entre as Participantes 10 e 12), pode-se pensar no quanto essas mulheres estariam falando de suas fantasias de mães ideais destruídas. Conforme referem, as pacientes sentem-se debilitadas e frágeis, características estas contrárias àquelas fantasiadas sob a figura materna idealizada, tão onipotente e plena.
No tocante à preocupação com a saúde do bebê, pode-se pensar que as participantes, ao trazerem receios sobre o estado de saúde de seus bebês, estariam inconscientemente trazendo seus medos sobre suas capacidades em gerar uma vida saudável. De acordo com Garcia (2002), faz-se natural o desejo, por parte da mulher, de que o bebê corresponda à figura de um bebê perfeito e saudável, até porque ele representa um resgate do narcisismo dos pais. Ademais, segundo Debray (1988), o temor à concepção de um filho anormal estaria relacionado à fantasia de punição pela transgressão edipiana.
c.4) Discurso associado à carreira profissional
Sub-categoria na qual encontram-se os discursos manifestos das pacientes a respeito das dificuldades na vivência da gravidez, em detrimento à vivência profissional.
“É por isso que eu digo que essa gravidez não veio numa boa hora. Eu estava muito envolvida com o meu trabalho, com o meu salário. Não era a hora, ainda, de eu parar. Pra você ter uma idéia, eu até sonho, às vezes, que estou trabalhando” (Participante 5).
“Na mesma semana que eu peguei o resultado do exame (de gravidez), eu tinha agendada uma entrevista para um emprego, em um hospital. Tive que desistir da seleção, né? Minha mãe ficou muito decepcionada comigo...” (Participante 11).
Dentro desta sub-categoria, cinco participantes referiram dificuldades em aceitar a gestação não planejada, em detrimento de seus projetos profissionais. Pode-se compreender que ao trazerem esses conflitos acerca da vida profissional, elas estariam discorrendo sobre suas dificuldades em investir tanta libido em um objeto outro (bebê), em detrimento ao auto-investimento libidinal – afinal, trabalhar representa um investimento nos projetos pessoais.
Conforme Mondardo e Lima (1998), na maternidade, o comprometimento e a responsabilidade são mais intensos se comparados com aqueles demandados pela atividade profissional, haja vista que um trabalho sempre pode ser abandonado, caso traga desprazeres; ao contrário da irreversibilidade de ter filhos. Ademais, segundo Sasson (1988), a mulher pode vir a se sentir plena e fálica não apenas por meio da maternidade, mas também de sua atividade profissional, uma vez que o falus pode ser qualquer objeto de desejo.

Considerações finais
A partir das entrevistas e das análises realizadas, pôde-se observar uma associação entre os motivos inconscientes das participantes em engravidar, a seus motivos conscientes para o não planejamento das gravidezes. Tanto ocorre esta associação, que se pode constatar que as categorias emergentes na análise categorial sobre os motivos conscientes contrários à gestação, e os motivos inconscientes pela gravidez, foram muito similares.
Assim, de maneira geral, notou-se que enquanto algumas pacientes traziam como queixa principal, ao longo das duas entrevistas, o fato de terem engravidado de um relacionamento falido, via-se que o que lhes havia motivado inconscientemente a engravidar era justamente o desejo em reconstruir esses relacionamentos. Ainda, ao mesmo tempo em que algumas participantes queixavam-se do peso de terem engravidado em um momento em que se encontravam adoecidas e mais fragilizadas, via-se que seus desejos em gestar associavam-se a buscar pulsão de vida em um período imerso em instinto de morte.
Esta associação entre o desejo inconsciente em prol da gestação e a motivação consciente contrária a ela revela o quanto este aparente conflito entre as esferas manifesta e latente não consiste propriamente em um conflito. De fato, essas esferas estariam intimamente relacionadas com a gravidez não planejada, representando um desejo do inconsciente, revelando o quanto o mundo psíquico interfere no comportamento do soma.
A despeito de todas as categorias que foram elaboradas no intuito de se diferenciar os diversos motivos inconscientes pela ocorrência da gestação, pôde-se notar que todos as motivações correspondiam basicamente ao desejo de vida e de esperança dessas mulheres. Independentemente se suas frustrações relacionavam-se à esfera conjugal, familiar, de saúde etc, todas as participantes buscavam inconscientemente, por meio de suas gestações, instinto de vida em alguma esfera mais “adoecida” de suas vidas.
Pensamos que gravidez é, a priori, vida, saúde, nascimento... É claro que para muitas mulheres, gravidez pode representar mais perdas do que ganhos, e aqui não se pretende realizar um julgamento a esse respeito. O que está sendo defendido é que, independentemente se a realidade concreta seja essa, na fantasia dessas mulheres, suas gravidezes lhes ajudariam em termos sublimatórios. Pode-se até elucubrar que os sentimentos manifestados de rejeição pelas gravidezes, por parte de algumas, deviam-se justamente ao fato de suas gestações não terem conseguido cumprir suas finalidades sublimatórias.
Pensando nessas insatisfações, vê-se o quanto se faz imprescindível que haja um espaço terapêutico para que essas mulheres possam falar de suas motivações inconscientes pela gestação; dos desejos de vida que buscavam realizar por meio dessas gravidezes; das frustrações pela não realização desses aspectos sublimatórios, por meio das gestações... Faz-se necessário que elas possam falar de suas fantasias e sofrimentos, contando com uma escuta analítica que lhes seja tão continente quanto elas acreditavam que suas gestações lhes seriam, para que daí possam assumir futuramente o papel continente para com seus frutos.

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